E quando a gente que está machucando as pessoas que amamos?
Estar em um relacionamento saudável me fez ver e entender muitas complexidades que antes pareciam impossíveis de existir
Escrevo esse texto me inspirando nas palavras de Beyoncé em All Night e em Ordinary People, de John Legend.
Talvez esse seja o texto mais pessoal e difícil que já escrevi nesse um mês e meio de Una Charla Más, porque é óbvio que ninguém quer encarar as partes feias e sombrias que rodeiam a gente. Porém, esse registro e compilado de insights das minhas sessões de terapia são para ajudar a me curar, processar e, talvez, inspirar outras pessoas.
Ah, e mais um ponto, o que falarei aqui é sobre afeto e amor romântico, baseado nas minhas experiências, mas isso pode se encaixar com uma amizade, com sua família e afins.
Eu não acredito que ninguém seja 100% bom ou 100% ruim, acho que somos uma soma de experiências, erros e aprendizados que nos moldam. Mas essa conclusão demorou para acontecer. É claro, que se você é uma pessoa de caráter e que não quer ser o cão na vida de alguém, você nunca fará algo para machucar aqueles que ama intencionalmente. No entanto, é inerente do ser humano errar e, como consequência, ser a razão da dor de alguém, mesmo que seja sem querer.
Eu sou uma pessoa que carrega muitos traumas, aqui nesse pacote, você encontra daddy issues, mommy issues, inseguranças e muitos mais. E com as experiências “amorosas” que tive, fui entendendo que, realmente, não havia esperança para mim e minha vontade de ser amada. Sabe aquele escape de machucar antes de ser machucada? Ou então, abandonar antes de ser abandonada? Esses eram o meu go-to para todos os meus envolvimentos.
Na psicologia, dizem que repetimos padrões vimos em nossos pais, avós ou pessoas muito próximas, e sou a prova viva que isso é real. Quando você não vê sua mãe, sua avó, sua tia ou uma pessoa que admira sendo amada incondicionalmente, é difícil acreditar que você pode quebrar esse ciclo. Para mim, era óbvio que em algum momento tudo que vi e vivi iria se repetir e que essa boa fase era temporária — às vezes, ainda penso isso, haja terapia para mudar nossas crenças.
Desde que eu comecei a namorar e esses traumas começaram a emergir com força, eu percebi que meus métodos de defesa, podiam até me proteger de possíveis corações quebrados, só que eles feriam a pessoa que eu amava. Eu nunca me deixei ser vulnerável com ninguém, afinal, no final todos iam embora, só que você não pode construir relações assim.
Lembro de quando fiz aniversário de namoro, fiz uma retrospectiva e odiei a Ana, namorada que eu encontrei porque não era quem eu queria ser. No entanto, sem perceber, eu repetia os mesmo padrões e me autossabotava para ir para minha zona de conforto, onde me machucar era inevitável, mas com isso eu sabia lidar. Agora ser amada, de verdade? Isso não era uma coisa que eu estava acostumada, nem em um bilhão de anos.
Isso minou minha autoconfiança e quase minou meu relacionamento por completo. Porque quando você não consegue se dar graça, nem se amar, é difícil enxergar limites, entender o que te mágoa e acreditar que você merece, sim, ser amada e respeitada, independente dos seus defeitos. Isso nos leva a uma linha muito tênue de nos colocar em relacionamentos ruins ou minar relacionamentos bons com dependência emocional e baixa autoestima. E eu sei, que isso é a realidade e sentimento de muitas mulheres iguais a mim, que estão sendo assumidas e levadas a sério pela primeira vez.
Uma vez ouvi a seguinte frase “You can't love someone while being afraid to lose them”, ou seja, você não consegue amar alguém, tendo medo de perdê-lo. Isso porque esses sentimentos não podem existir em um mesmo círculo, em algum momento, seu ego tomará conta e você começará a machucar aqueles que ama, pelo medo de que eles te deixem. E uma novidade que aprendi, todo mudo tem o direito de ir ou de ficar, é uma escolha que também temos.
Ser vulnerável é a única maneira de darmos ao outro uma possibilidade de conhecer as nossas complexidades, das mais belas às mais feias, para que ele possa escolher se quer te amar por completo. E nós merecemos um amor como Beyoncé canta em Flaws and All, que veja potencial nos nossos defeitos que mais odiamos. Não se abrir, não vai prevenir que seu coração quebrado de uma forma ou outra, e, é claro, que ninguém quer ter relacionamentos falidos na lista da sua vida, mas também não vai te dar a chance de amar completamente, porque seu ego sempre falará mais alto.
Meu amado me ensinou muito sobre amar e receber amor, porque ele me viu muito além daquela Ana que estava medrosa, escondida em padrões nocivos, não só para gente, mas para mim. Ver ele vulnerável e me amando mesmo nas minhas sombras, me deu vontade de fazer a mudança em mim e ter amor por mim mesma. E essa é a graça de amar alguém profundamente, de corpo e alma, né?
Amar é uma construção e uma escolha, depois do fogo da paixão o que fica é a gente sem máscaras e vamos ter que lidar com o erro de quem amamos, mostrar o que nos magoa, esperar melhora e seguir em frente. E da mesma maneira podemos escolher nos dar graça, aceitar que vamos errar, mas que podemos evoluir desse erro (e nada de usar isso como desculpa para ser escroto, hein?). Afinal, por que só você merece ficar carregando um peso de culpa de erros passados, que não podem mudar?
Estar numa relação é tipo investir em ações de alto risco, quando dá certo nos leva ao nirvana, mas pode deixar a gente na merda. E essa não é a beleza do amor? Amar além do que gostamos, mas por completo, sem vírgulas, apenas se tornando sua melhor versão, não para o outro, mas porque sabemos que assim teremos alguém nos segure para alcançar a plenitude dessa jornada louca.
Conversa intensa essa, mas e aí fica para a próxima?